Esta estória sucedeu já no Inverno passado
Mas só agora achei o momento asado
Para a contar
Vestia a minha soberana samarra
E o boné
Que uso quando o mau tempo acomete
Como apareço em fotos difundidas pela net
Pelo que não será difícil alguém me referenciar
Sentado à mesa de um café
A tomar o pequeno-almoço
Embora só presente até ao pescoço
De olhar fixo num ponto dentro de mim
Embora sem nada ver
Dentro e fora
Enquanto o meu espírito vogava
E pensava
Que a vida é sim um desencanto
Tanta coisa linda
Em que acreditamos quando criança
E nos inunda de esperança
Que até nos causa espanto
E que depois concluímos não existirem
Nos são contadas só para nos iludirem
É o Pai Natal
O Menino Jesus
As fadas
Os duendes
O mítico Portugal
As moiras encantadas
As bruxas
Ou mesmo as palavras esdrúxulas
Quanto a bruxas
Ah!
Sei que continua a haver quem diga
Que não acredita
Mas que as há
Há
Mas isso é outra cantiga
Estava eu nestas tergiversações supra reais
Quando senti alguém
Tocar-me ao de leve
Muito suavemente
Para meu assombro
Já que não esperava ninguém
Seria gente?
Uma fada?
Uma bruxa?
Um pingo de chuva?
Talvez fosse alguma palavra esdrúxula
Que com o Acordo Ortográfico andam disparatadas
Já que são agora acentuadas
De grave ou de circunflexo
Pensei
Não liguei de imediato
Mas ao segundo toque despertei
Perplexo
Nem era a chuva
Uma bruxa
Nem uma palavra esdrúxula
Que essas não tocam assim
Era uma fada verdadeira
De carne osso
Perfumada
De cara iluminada
Pelo olhar
E que usou o sorriso sedutor
Como varinha de condão
Para me tocar o coração
E falou-me
Para me dizer
Que me adorava ler
Mas que não achava os poetas fiáveis
Porque não sabem guardar segredos
Todos os amores e medos
Grandezas e fraquezas
Que alguém cai na asneira
Mesmo se por brincadeira
De com um poeta partilhar
É sabido que vão parar à net
E por todo o Universo
Se irão espalhar
Em verso
Embora nem sempre se saiba
A quem o poema remete
Por isso ela ali me aparecia
Para com a sua fantasia
Tornar credível
A minha poesia
Mas que tinha a certeza
Que eu lhe iria dar razão
Já no próximo poema
Versando este tema
Tocou-me o coração
Respondeu afirmativa mente ao meu convite
De “aparece quando quiseres”
E desapareceu
Deixando-me no limite
Em alvoroço
Afinal as fadas existem
E são de carne e osso
Perfumadas
Radiosas
Amorosas
Assim como mulheres
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